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Autoestrada fracassada? Parte 2

Autoestrada inevitável


 

Obra literária bastante popular, a série de livros do inglês Douglas Adams, intitulada “O Guia do Mochileiro das Galáxias”, começa com esse mesmo tema (abordado na parte 1): O de um lar que precisa ser desapropriado e demolido para a construção de uma rodovia. O morador, o solteirão Arthur Dent, até aquele momento em que os caminhões e tratores estacionam diante da sua casa, ignora a realidade e os projetos urbanos no qual estava inadvertidamente inserido. Ao compreender o que se passa, Arthur decide por deitar-se diante de seu lar e resistir bravamente à demolição, o que transtorna enormemente ao gerente de obras que se dispõe a negociar com ele. Um amigo de Arthur consegue, enfim, demovê-lo de seu ato de resistência e o leva ao pub mais próximo a fim de tomarem uma cerveja, a despeito da demolição inevitável.

O fato é que esse amigo do Arthur era um alienígena disfarçado de humano e o próprio planeta Terra estava prestes a ser destruído, para dar passagem a uma supervia intergalática. Aquele alienígena era o único ser no planeta (além dos golfinhos) que sabia disso previamente e houvera se decidido a salvar Arthur, pegando carona em uma nave espacial antes que a Terra fosse explodida por uma frota de construtores terceirizados do planeta Vogon. Diferentemente dos desenhos animados, no caso dessa obra literária, o personagem Arthur em relação à sua casa e toda a humanidade em relação ao planeta Terra, estão fadados ao fracasso. A obra explora, a partir desse momento e nas subsequentes viagens de Arthur por um universo em que a Terra não existe mais e ele é o único ser humano sobrevivente, a ideia da insignificância do homem perante o cosmos, da angústia de um mero indivíduo diante da grandeza do universo.

Há nesse começo do livro uma piada que nos remete às ideias de provincianismo e cosmopolitismo. A piada se dá quando o chefe de obras admoesta Arthur por não ter se dado o trabalho de ir à sede da municipalidade local a inteirar-se sobre os despachos e memorandos que tê-lo-iam avisado previamente sobre aquele evento de demolição, insinuando que Arthur estaria pagando o preço por não se interessar pelos eventos mais gerais da sua comunidade. Em outras palavras, que Arthur era um idiota, no sentido etimológico desse termo. Idiota, na Grécia antiga de onde o termo provém, era o sujeito que optava por não participar dos eventos comunitários, cuidando apenas de seus negócios familiares, em sua propriedade rural, alheio à vida pública. Algumas páginas depois, quando os Vogons ligam um gigantesco sistema de comunicação para declarar à comunidade humana global que seu planeta será destruído, o porta-voz dos alienígenas admoesta os humanos no mesmo sentido que o mestre de obras admoesta Arthur, de que, se os humanos não tiveram sequer o interesse de saber o que acontecia dentro de sua própria galáxia, já que os documentos relativos à demolição da Terra estavam há anos disponíveis em Alfa Centauro, mereciam aquele destino que lhes caía, literalmente, sobre as cabeças.

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