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  • Pedro Lobato Moura

Lua Lotada, bar

Lua Lotada é um bar, um boteco, uma cantina, uma bodega. É um bar antigo, em uma ilha tropical. Começou com uma fogueira e uns tocos, hoje se parece com um bar comum, paredes de alvenaria cobertas de fotografias, recortes de jornal sobre fatos históricos da ilha, do bar e do time de futebol local, telhado sem goteiras, uma porta larga, mesas na calçada, um pequeno palco onde cabe um ao violão e um na caixinha de fósforos. Lugar um tanto rústico, mal iluminado, mas asseado o suficiente, a cerveja é gelada, o tira-gosto muito bom. Os clientes mais antigos sentam ainda nos tocos, no fundo do bar, perto do caixa. Nem o sr. Octávio, frequentador contumaz, passado dos noventa, curtido no éter, sabe que senta em tocos de mais de mil anos.

Um bar cumpre a função de suspender o tempo, o deus implacável dos ponteiros, dos trabalhos, do rame-rame com o mundo. ''Lua Lotada, aqui, tens tempo''. Existe, sim, um relógio de parede, movido a corda, com intrincados desenhos das estações do ano, com peixes e pássaros e flores. Marca, no entanto, um horário próprio, subjetivo. Todos devem deixar os relógios de pulso ou de bolso, analógicos ou digitais, com Zileide, na entrada. Celulares são proibidos. Não tem sinal de internet no Lua Lotada.


Em geral, os clientes bebem ali por horas ou dias seguidos. É claro que há os turistas que entram querendo apenas uma água mineral, um isqueiro, um chiclete, uma informação ou mesmo uma marmita para viagem. Talvez, enquanto a marmita vai sendo preparada, a turista comece a olhar os desenhos na parede. Perceberá que muitos provêm da mesma mão, retratos, paisagens, pequenas tirinhas de humor, a maioria feitos a esferográfica azul sobre guardanapo. Pode a turista acaso perguntar, se o artista é um cliente, ou por que há um altar de santo com uma estatueta de moleque jornaleiro do século XIX, ou sobre os troféus e bandeiras verde-negras, e se o fizer, poderá entrar de vez naquele tempo outro. Se não o fizer, se for alguém determinada a pegar o que procura e seguir em frente em sua viagem, seguirá. Daí a alguns quilômetros, sentirá uma saudade, quem sabe, ou vai perceber em alguém ou na paisagem alguma beleza incomum, ou vai lembrar da infância, quando o tempo passava mais devagar.




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